“Ficções é talvez o livro mais reconhecido de Jorge Luis Borges, e que inclui contos fundamentais para entender o seu universo, como «O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam», «As Ruínas Circulares» ou «A Biblioteca de Babel». Há narrativas de natureza policial, como «A Morte e a Bússola», a história de um detetive que investiga o assassinato de um rabino; outras, que recriam livros imaginários como «Tlön, Uqbar, Orbis Tertius», reflexão extraordinária sobre a literatura e sua influência no mundo físico; e outras que podem ser consideradas fundadoras do moderno género fantástico, como «O Sul», que, nas palavras do mesmo autor, é talvez a sua melhor história.”
In Ficções (2020), Quetzal Editores
Ficções chegou a Portugal em 1972, publicado pela editora Livros do Brasil, com tradução de Carlos Nejas, com revisão de Maria Ondina Braga. A tradução de José Colaço Barreiros surgiu na Teorema, em 1998, segundo o catálogo da Biblioteca Nacional, tendo conhecido desde então várias reedições, incluindo a mais recente, na Quetzal, em 2020.
“Jorge Luis Borges nasceu em Buenos Aires, em 1899. Cresceu no bairro de Palermo, «num jardim, por detrás de uma grade com lanças, e numa biblioteca de ilimitados livros ingleses». Em 1914 viajou com a família pela Europa, acabando por se instalar em Bruxelas, e posteriormente em Maiorca, Sevilha e Madrid. Regressado a Buenos Aires, em 1921, Borges começou a participar ativamente na vida cultural argentina. Em 1923, publicou o seu primeiro livro – Fervor de Buenos Aires –, mas o reconhecimento internacional só chegou em 1961, com o Prémio Formentor, seguido por inúmeros outros. A par da poesia, Borges escreveu ficção (é sem dúvida um dos nomes maiores do conto ou da narrativa breve), crítica e ensaio, géneros que praticou com grande originalidade e lucidez. A sua obra é como o labirinto de uma enorme biblioteca, uma construção fantástica e metafísica que cruza todos os saberes e os grandes temas universais: o tempo, «eu e o outro», Deus, o infinito, o sonho, as literaturas perdidas, a eternidade – e os autores que deixam a sua marca. Foi professor de literatura e dirigiu a Biblioteca Nacional de Buenos Aires entre 1955 e 1973. Morreu em Genebra, em junho de 1986.” In Quetzal editores
Jorge Luís Borges, ilustração de Gonçalo Viana
Afinal, quem foi Jorge Luis Borges? – o artigo de Tiago Matos, na Revista Estante.
Jorge Luis Borges entrevistado pela televisão norteamericana
“As sete peças deste livro não requerem elucidação de maior. A sétima («O jardim dos caminhos que se bifurcam») é policial; os seus leitores assistirão à execução e a todos os preliminares de um crime, cujo propósito não ignoram, mas que não compreenderão, julgo eu, até ao último parágrafo. As outras são fantásticas, uma - «A lotaria na Babilónia» - não é de modo nenhum inocente de simbolismo. Não sou o primeiro autor da narrativa. «A biblioteca de Babel»; os curiosos da sua história e pré-história podem consultar certa página do nº 59 de SUR, que regista os nomes heterogéneos de Leucipo e de Lasswitz, de Lewis Carroll e de Aristóteles. Em «As ruínas circulares» tudo é irreal; em «Pierre Menard, autor do Quixote» é-o o destino que o protagonista se impõe a si próprio. A lista dos escritos que lhe atribuo não é muito divertida, mas não é arbitrária; é um diagrama da sua história mental …
Desvario laborioso e empobrecedor é o de compor vastos livros; o de espraiar por quinhentas páginas uma ideia cuja perfeita exposição oral cabe em poucos minutos. Melhor procedimento é simular que esses livros já existem e oferecer um resumo, um comentário. Assim procedeu Carlyle em Sartor Resartus; e igualmente Butler em The Fair Haven; obras que têm a imperfeição de serem também livros, e não menos tautológicos que os outros. Mais razoável, mais inepto, mais mandrião, eu preferi a escrita de notas sobre livros imaginários. São elas «Tlon, Uqbar, Orbis Tertius» e a «Análise da obra de Herbert Quain»
In Prólogo, Ficções (2020), Quetzal Editores
Ler Mais, Ler Melhor - Livro da vida Rui Reininho, Ficções, de Jorge Luis Borges
“A escrita metódica distrai-me da presente condição dos homens. A certeza de que está tudo escrito anula-nos ou envaidece-nos. Conheço distritos onde os jovens se ajoelham diante dos livros e lhes beijam barbaramente as páginas, mas não sabem decifrar uma única letra. As epidemias, as discórdias heréticas, as peregrinações, que inevitavelmente degeneram em banditismo, têm dizimado a população. Creio já ter mencionado os suicídios de ano para ano cada vez mais frequentes. Talvez me enganem a velhice e o temor, mas tenho a suspeita de que a espécie humana - a única - está prestes a extinguir-se e que a Biblioteca perdurará: iluminada, solitária, infinita, perfeitamente imóvel, armada de volumes preciosos, inútil, incorruptível, secreta.
Acabo de escrever infinita. Não intercalei este adjetivo por um hábito retórico; digo que não é ilógico pensar que o mundo é infinito. (…) Quem o imagina sem limites esquece que os tem o número possível de livros. Atrevo-me a insinuar esta solução do antigo problema: «A biblioteca é ilimitada e periódica». Se um eterno viajante a atravessasse em qualquer direção, verificaria ao cabo dos séculos que os mesmos volumes se repetem na mesma desordem (que, repetida, seria uma ordem: a Ordem). Esta elegante esperança alegra a minha solidão.”
Alberto Manguel – Memórias de Jorge Luis Borges
“(…) O livro é um acervo indeciso de rascunhos contraditórios. Examinei-o umas vezes: no terceiro capítulo morre o herói, no quarto está vivo. Quanto à outra empresa de Ts´ui Pen, o seu Labirinto …
«- O Labirinto está aqui – disse apontando-me uma alta escrivaninha lacada.
«- Um labirinto de marfim! – exclamei. - Um labirinto mínimo …
«- Um labirinto de símbolos – corrigiu. – Um invisível labirinto de tempo. A mim, bárbaro inglês, foi dado a revelar esse mistério diáfano. Ao fim de mais de cem anos, os pormenores são irrecuperáveis, mas é dificil conjecturar o que sucedeu. Ts´ui Pen teria dito uma vez: “Retiro-me para escrever um livro.” E outra: “Retiro-me para construir um labirinto.“ Todos imaginaram duas obras; ninguém pensou que o livro e o labirinto eram um único objeto.”
“Borges nunca fez outra coisa se não ler, melhor, mais detida e intricadamente, munido de amplas ressonâncias, de uma planta minuciosa da maior das bibliotecas.” - leia o artigo de Diogo Vaz Pinto no jornal I.
«Com Ficções, Borges inventou a literatura virtual.»
José Saramago
«Talvez me enganem a velhice e o temor, mas tenho a suspeita de que a espécie humana – a única – está prestes a extinguir-se e que a Biblioteca perdurará: iluminada, solitária, infinita, perfeitamente imóvel, armada de volumes preciosos, inútil, incorruptível, secreta.»
Jorge Luis Borges
Outros livros de Jorge Luís Borges:
Veja outros "Um Livro por Semana".