ISBN: 978-989-8864-46-8
Edição: outubro de 2018
Editor: Elsinore
N.º de páginas: 144
Giorgio van Straten escreveu um pequeno ensaio intitulado Histórias de Livros Perdidos. Um livro pequeno, mas intenso. Reflexivo. Curioso. Fascinante, para quem se interessa pela história do livro e da leitura. Cada capítulo, uma história de um livro perdido. Não falamos de livros que se perdem e que rapidamente poderão ser recuperados pela aquisição de outro exemplar, pelo contrário, são livros “que existiram e que, agora, não existem”. Há muitas razões para que um livro fique perdido: porque o manuscrito se perdeu, porque o autor o destruiu, por lealdade, morte, separação, censura, entre outras.
Mas qual o interesse de escrever um livro sobre livros perdidos? O autor sente um fascínio quase infantil por aquilo que escapa, o que o motiva a empreender uma “volta ao mundo em oito volumes, ao invés de oitenta dias”, ou seja, a encetar uma busca, para, depois, nos contar a sua história em oito capítulos. Como um detetive, van Straten viaja no espaço e no tempo, interrogando, vasculhando lugares, papéis e memórias, seguindo pistas em busca de livros perdidos, livros que agora só existem nas histórias que deles se contam. Afinal, “os livros perdidos têm algo que os outros não possuem: deixam-nos, a nós, não leitores, a possibilidade de imaginá-los, de contá-los, de reinventá-los.”
Cada livro perdido tem a sua história. O autor inicia a obra com o testemunho de uma vivência pessoal, em sua casa, em Florença, falando de um livro que leu, com grande emoção, das novas palavras descobertas, de “uma linguagem maravilhosamente enxuta”, das palavras de um amigo e de um mestre que tanto admirava (Romano Bilenchi). Uma leitura inesquecível. Uma bela história de amor. Daqui, “viaja” para Londres; após um percurso circular, durante o qual passa por vários países (França, Polónia, Rússia, Canadá e Espanha), volta a Londres - tal como Phileas Fogg - para contar o desaparecimento do oitavo livro, Double Exposure, de Sylvia Plath. Ernest Hemingway, George Byron, Nikolai Gógol, Malcolm Lowry, Bruno Schulz e Walter Benjamin são os outros autores dos livros perdidos que protagonizam as histórias contadas neste volume.
Acontecimentos fortuitos estão, muitas vezes, na origem do desaparecimento dos manuscritos. Uma das histórias, a de Ernest Hemingway, leva-nos a Paris e ao ano de 1922. Uma mulher, uma mala, uma estação de comboios, uma corrida para ir comprar uma garrafinha de água e, no regresso… A mala já não está na rede porta-bagagens do comboio. A mala pertence à primeira mulher de Hemingway e contém os primeiros ensaios narrativos do futuro Nobel da Literatura. A história é contada em Paris é uma festa, romance publicado após a sua morte e que, ironicamente, “nasce de uma série de apontamentos que Hemingway tinha abandonado […] dentro de duas maletas, no final dos anos 30, no Hotel Ritz de Paris, cuja posse recuperou em novembro de 1956, precisamente porque o diretor daquele hotel lhe indicou a sua presença”.
Estas são histórias – algumas trágicas - de oito livros queimados, rasgados, roubados, ou simplesmente desaparecidos... Para sempre. Se a esperança de encontrar algum deles é mínima, subsiste, no entanto, por vezes, a hipótese de alguém, algum dia, algures…
E hoje em dia, será fácil perder um livro? Devido à quantidade de suportes em que atualmente pode ser gravado, parece quase impossível que um livro desapareça irremediavelmente, sem deixar rasto. E o sabor das palavras será o mesmo? O que dirão todos os que amam o livro enquanto objeto? Paradoxalmente, no entanto, “em certos casos, a imaterialidade é tão frágil como o velho papel”... O que continua a deixar aberto o caminho àqueles que, como Giorgio van Straten, perseguem “o risco de uma impossibilidade”.
Equipa do PNL2027